Decágono Regular
Consideremos um decágono regular para o qual os pontos \(A\), \(B\), \(C\), \(D\), \(E\) e \(F\) são vértices consecutivos, \(d\) a medida da sua diagonal mais longa e \(l\) a medida do seu lado. Supondo que \(d\) e \(l\) são comensuráveis, temos \(d=mx\) e \(l=nx\), onde \(m\) e \(n\) são inteiros positivos e \(x\) é uma medida comum à diagonal mais longa e ao lado do decágono. Note-se que cada lado é uma corda da circunferência que circunscreve o polígono à qual corresponde um arco de amplitude \(\frac{1}{10}.360\,^{\circ}=36\,^{\circ}\). Marcamos os pontos \(G\) e \(H\) na diagonal \([CF]\) tal que \(\overline{CG}=\overline{GH}=l\). Então, como \([CDG]\) é isósceles e \[G\hat{C}D=F\hat{C}D=\frac{1}{2}.2.36\,^{\circ}=36\,^{\circ},\] vem \[C\hat{D}G=C\hat{G}D=\frac{1}{2}.(180\,^{\circ}-36\,^{\circ})=72\,^{\circ}.\] Além disso, \[E\hat{D}G=E\hat{D}C-C\hat{D}G=\frac{1}{2}.8.36\,^{\circ}-72\,^{\circ}=144\,^{\circ}-72\,^{\circ}=72\,^{\circ}=C\hat{G}D,\] logo a diagonal \([CF]\) é paralela ao lado \([DE]\). Então, como \([GH]\) é paralelo a \([DE]\) e \(\overline{GH}=\overline{DE}\), temos que \([GDEH]\) é um paralelogramo, sendo \(\overline{GD}=\overline{HE}\) e \(H\hat{E}D=180\,^{\circ}-E\hat{D}G\). Como \(\overline{OC}=\overline{OF}\), \([OCF]\) é um triângulo isósceles, com \[O\hat{C}F=O\hat{F}C=\frac{1}{2}.2.36\,^{\circ}=36\,^{\circ}.\] Temos então que \[C\hat{O}G=C\hat{O}D=36\,^{\circ}=O\hat{C}G,\] pelo que \([OCG]\) é um triângulo isósceles, com \(\overline{OG}=\overline{CG}=l\). Logo, \[\overline{GD}=\overline{OD}-\overline{OG}= \frac{1}{2}d-l.\]
Seja \(l\) o ponto de intersecção da recta \(EH\) com a diagonal \([AF]\). Como \(\overline{OD}=\overline{OE}\), \([ODE]\) é um triângulo isósceles, com \[O\hat{D}E=D\hat{E}O=\frac{1}{2}(180\,^{\circ}-D\hat{O}E)=\frac{1}{2}(180\,^{\circ}-36\,^{\circ})=72\,^{\circ}.\] Logo, \[I\hat{E}D=H\hat{E}D=180\,^{\circ}-E\hat{D}G=180\,^{\circ}-O\hat{D}E=108\,^{\circ},\] \[I\hat{E}F=F\hat{E}D-I\hat{E}D=\frac{1}{2}.8.36\,^{\circ}-108\,^{\circ}=36\,^{\circ},\] \[I\hat{F}E=A\hat{F}E=\frac{1}{2}.4.36\,^{\circ}=72\,^{\circ}\] e \[F\hat{I}E=180\,^{\circ}-I\hat{E}F-I\hat{F}E=72\,^{\circ}=I\hat{F}E,\] pelo que \([IEF]\) é um triângulo isósceles, com \(\overline{IE}=\overline{FE}=l\). Então, vem \[\overline{IH}=\overline{IE}-\overline{HE}=\overline{IE}-\overline{GD}=l-\left(\frac{1}{2}d-l\right)=2l-\frac{1}{2}d.\] Temos também que \(\overline{OE}=\overline{OF}\), logo \([OEF]\) é um triângulo isósceles, com \[O\hat{E}F=E\hat{F}O=A\hat{F}E=72\,^{\circ},\] pelo que \[O\hat{E}I=O\hat{E}F-I\hat{E}F=72\,^{\circ}-36\,^{\circ}=36\,^{\circ}=I\hat{O}E\] e \([IOE]\) é um triângulo isósceles, com \(\overline{IO}=\overline{IE}=l\).
Seja \(J\) o ponto do segmento \([IF]\) tal que \[\overline{IJ}=\overline{IH}=2l-\frac{1}{2}d\] (note-se que \[\overline{IF}=\overline{OF}-\overline{OI}=\frac{1}{2}d-l>2l-\frac{1}{2}d,\] dado que \[\begin{array}{ccl} \frac{1}{2}d-l\leq2l-\frac{1}{2}d & \Leftrightarrow & d\leq3l\\ & \Leftrightarrow & \frac{d}{l}\leq3\\ & \Leftrightarrow & \frac{1}{\sen\frac{\pi}{10}}\leq3\\ & \Leftrightarrow & \sen\frac{\pi}{10}\geq\frac{1}{3} \end{array}\] e isto é absurdo uma vez que \(\sen\frac{\pi}{10}=\frac{\sqrt{5}-1}{4}\approx0,31\)). Então, \([IHJ]\) é um triângulo isósceles, com \[I\hat{H}J=I\hat{J}H=\frac{1}{2}(180\,^{\circ}-J\hat{I}H)=\frac{1}{2}(180\,^{\circ}-F\hat{I}E)=54\,^{\circ}.\] Mas então \[F\hat{J}H=180\,^{\circ}-I\hat{J}H=126\,^{\circ}\] e \[J\hat{F}H=O\hat{F}C=36\,^{\circ},\] pelo que \([JFH]\) é semelhante ao triângulo \([DCF]\), uma vez que \[D\hat{C}F=\frac{1}{2}.2.36\,^{\circ}=36\,^{\circ}=J\hat{F}H\] e \[C\hat{D}F=\frac{1}{2}.7.36\,^{\circ}=126\,^{\circ}=F\hat{J}H.\]
Assim, podemos construir um decágono regular que passa pelos pontos \(F\), \(J\) e \(H\), sendo \([FJ]\) um dos seus lados e \([JH]\) uma das suas segundas diagonais mais curtas. Note-se que um dos vértices deste novo decágono encontra-se na diagonal \([DF]\) (mais propriamente, é o ponto de intersecção de \([DF]\) com \([IE]\), uma vez que \(J\hat{F}D=\frac{1}{2}.3.36\,^{\circ}\) e \[F\hat{H}E=F\hat{G}D=180\,^{\circ}-C\hat{G}D=108\,^{\circ}=\frac{1}{2}.6.36\,^{\circ})\] e outro vértice encontra-se no lado \([EF]\) (uma vez que \(J\hat{F}E=\frac{1}{2}.4.36\,^{\circ}\)). Sejam \(K\) e \(L\) estes dois pontos, respectivamente. Temos que \(K\hat{E}L=I\hat{E}F=36\,^{\circ}\) e \[K\hat{H}L=K\hat{L}H=\frac{1}{2}.36\,^{\circ}=18\,^{\circ},\] logo \[E\hat{K}L=K\hat{H}L+K\hat{L}H=36\,^{\circ}=K\hat{L}E\] e \([KEL]\) é um triângulo isósceles, com \(\overline{EL}=\overline{KL}=\overline{JF}\). Logo, as medidas do lado e da diagonal mais longa são dadas por: \[l_{1}=\overline{JF}=\overline{OF}-\overline{OI}-\overline{IJ}=\frac{1}{2}d-l-\left(2l-\frac{1}{2}d\right)=d-3l\] \[d_{1}=\overline{LF}=\overline{EF}-\overline{EL}=\overline{EF}-\overline{JF}=l-(d-3l)=4l-d\]
Como \(d=mx\) e \(l=nx\), temos: \[l_{1}=mx-3nx=(m-3n)x=n_{1}x\] \[d_{1}=4nx-mx=(4n-m)x=m_{1}x\] onde \(n_{1}=m-3n\) e \(m_{1}=4n-m\) são dois números inteiros positivos, com \(m_{1}<m\). De facto, \[\begin{array}{ccl} m_{1}\geq m & \Rightarrow & 4n\geq2m\\ & \Rightarrow & 2n\geq m\\ & \Rightarrow & 2l\geq d\\ & \Rightarrow & \frac{d}{l}\leq2, \end{array}\] o que é absurdo uma vez que \[\frac{d}{l}=\frac{1}{\sen\frac{\pi}{10}}=\frac{4}{\sqrt{5}-1}=\sqrt{5}+1>2.\]
Procedendo da mesma forma, vamos obter um novo decágono regular cuja diagonal mais longa é \(d_{2}=m_{2}x\) e cujo lado é \(l_{2}=n_{2}x\), sendo que \(n_{2}=m_{1}-2n_{1}\) e \(m_{2}=m_{1}-n_{1}\) são dois números inteiros positivos, com \(m_{2}<m_{1}<m\).
Uma vez que podemos continuar indefinidamente a construir novos decágonos regulares, vamos obter uma sucessão estritamente decrescente de números inteiros positivos: \[m_{1}>m_{2}>m_{3}>m_{4}>...\] tal que \(m_{i}<m,\:\forall i\in\mathbb{N},\) o que é absurdo, dado que não pode haver uma infinidade de números inteiros positivos distintos menores do que \(m\) (de facto, existem exactamente \(m-1\) elementos: \(1\), \(2\), \(3\), ..., \(m-2\) e \(m-1\)). Logo, a diagonal mais longa e o lado do decágono regular são grandezas incomensuráveis.